sexta-feira, 2 de novembro de 2012

      
De repente, como num filme ou livro, tinha percebido algo que parecia estranho. Percebera, após a leitura e aos pensamentos que a procederam, uma sensação que julgava não estar ali antes. Ou já estava? Escondida entre planos e projetos diversos. Como não havia dado foco a ela? Talvez a sensação não estivesse realmente ali. Talvez ela tivesse nascido naquele instante, ao final da leitura. Não conseguiu entender como aquela sensação aparecera assim, tão verdadeira, tão intensa, tão arrebatadora.
Passava a se ver de fora. A projetar sua própria trajetória como se fosse a história de um livro ou filme. Havia sentido isso alguns dias antes, em um ônibus. Na condição de passageira havia se sentido também passageira de sua história, como quem olha pela janela. Talvez tivesse sido um sinal. Mas só percebia essa possibilidade agora. E agora era ainda mais forte. Compreendeu que devia fazer algo com aquilo. Agora estava claro.
O dia estava claro. Depois de dias de muito sol, hoje amanhecera nublado, mas claro. Desde ontem sentira no ar, uma tranquilidade transparente. Pensara nos últimos acontecimentos com exatidão. Estava tranquila como um passageiro que aguarda chegar perto de seu ponto, para dar o sinal.
***
 A profissão fora escolhida ao longo de suas experiências. Devagar. O que não significava paciência. Tinha pressa. Mas entendeu, por fim, que o caminho seria longo. Passados alguns percalços, começara a se sentir feliz com a estrada. Gostou das escolhas. Talvez se preparasse em breve para as próximas, mas não sabia. Aprendeu a lidar com o tempo, com o seu tempo.
De repente, aquela sensação. Quis aproveitá-la ao máximo – sem saber ao certo o que poderia ser aproveitar uma sensação. Pensou em algumas possibilidades de ação. Poderia procurar endereços de emails e se achasse, poderia enviá-los. Quem sabe obtivesse resposta. Poderia marcar um encontro com uma antiga amiga, que talvez pudesse ajudá-la. Podia uma infinidade de coisas. Mas de qualquer jeito, seriam ações posteriores. Como aproveitar aquela sensação de quem saboreia, por longos minutos, um sorvete?


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Gostava de ter escolhido o que lhe possibilitava participar do movimento das coisas. Gostava de vibrar, quando depois de trabalhar exaustivamente, era hora do desenrolo daquele movimento todo. Vibrava ao observar a vibração das pessoas. Do que aquilo causava nelas. Vibrava com os pés, com as mãos, com os olhos, vibrava com o corpo todo. Vibrava quando encontrava outros olhos vibrando, e ria. Era disso que mais gostava.
Por isso, o espanto. Apesar de saber, desde criança, que gostava também do silêncio, como encarar a sensação de precisar passar para este outro lado? Encarar o silêncio. Sozinha. Encarar a decisão de dar foco ao que até ontem era extensão de si mesma.
            A sensação passara. Ficaria agora com o silêncio, o seu silêncio, vibrante.
  26/10/12